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sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

nunca antes, tão esvaziado ---

talvez pela morte da mãe (que ainda não me veio), hoje eu me sinto completamente esvaziado, por conta de me sentir tão preso (a ela).

penso que a mãe ocupa um lugar inteiro, para o qual não vale meia-entrada, não cabe desconto nem prosa conhecida. talvez por isso ainda me assuste tanto pensar o amargor dessa falta (talvez porque ela não me veio, ainda, em vida).

mas veja: na poesia, já faz tempo, mato e morro minha mãe todos os dias. perco-a de mim de maneiras várias, de formas espetaculares, via dores agudas e exageradas. talvez não devesse, mas talvez seja o jogo do poeta apenas o resumo do fato: estar treinando a maior dor do mundo para quando ela mesma chegar.

perder a mãe é como se descobrir livre. deve ser de uma solidão terrível. deve ser - eu talvez espere - de uma liberdade tremenda: afinal, como escrevi outro dia numa noutra peça, quem perde a mãe, mãe - ganha passe livre para se despedir - e sem pena do mundo - se dispensar...

por tudo isso, vinha escrevendo, que não sei de onde vou tirar a força para essa cor vermelho escurecida. esse luto (mesmo que não queira ser redundante e queira mostrar com essa morte da mãe nada mais do que é a vida), mesmo assim não o sei dizer, esse luto.

especulo devagar. a qualquer instante, começarei a transbordar. eu creio. é como se a cada palavra do romance (re)lida, é como se a cada palavra meu olhar do livro saltasse e fosse buscar noutro canto o seu corpo, a sua expressão.

se hoje eu fosse encenar esse romance, esse vermelho amargo, em cena além do relato, da confissão, em cena talvez houvesse apenas um sofá. carcomido pelo tempo. em cena, talvez, apenas a possibilidade da casa ultrapassada e o conforto de um afago já vencido.

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2 comentários:

  1. que lindo, e triste Diogo!
    também não me veio essa falta. e nem quero que venha.
    gostei do sofá. um sofá para morrer...
    'Vermelho' é um depoimento para uma plateia. é um falar um pensamento. Dor de quem nasce!
    se hoje eu fosse encenar esse romance, esse vermelho amargo, eu radicalizaria e diria que é uma peça de teatro sem dramaturgia.
    não tem uma fala que não seja a fala de um homem real, que existiu.
    toda a palavra, reunida em pequenos, breves episódios.
    'não se desata com delicadeza o nó que nos amarra a mãe'
    nó.

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  2. sim sim sim
    breves episódios
    vamos lá ---

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